Por: Rev. Charles Dewey
Estava hoje lendo 1Samuel 4 e seguintes, quando Israel, ao perder na guerra para os filisteus, mandou buscar a Arca da Aliança para o acampamento do exército.
Pelo que eu entendi do texto, Israel supôs que o simples fato de a Arca da Aliança estar lá com eles era uma garantia de vitória. Isso porque a Arca representava a própria presença de Deus.
Inclusive os filisteus também tinham essa mesma concepção, pois há um verso que diz que eles ficaram com medo, pois o Deus que tinha feito grandes coisas no Egito estaria no acampamento inimigo.
Como todo mundo deve saber, Israel foi derrotado e a Arca se tornou espólio de guerra.
As considerações são as seguintes: o que fez o exército de Israel pensar que a presença da Arca lhe garantiria a vitória? Outra, o que fez os filisteus tomarem-na como espólio e saírem regozijando da vitória? E ainda, o que aconteceu com o nome de Deus neste caso?
Bem gente, a primeira pergunta tem um contexto tão longo, que só pra quem tem tempo e conhecimento para responder propriamente. Mas aqui vai um esboço: Israel foi formado com uma concepção de Deus como sendo o Todo-Poderoso. Qualidades como imbatível, invulnerável, temível, terribilíssimo, conhecedor absoluto dos pensamentos e intenções faziam parte do emprego deste nome e Israel o sabia muito bem.
Israel sabia também que este ser Todo-Poderoso o havia escolhido para ser Seu povo e de alguma maneira, sabia também que, por inúmeras vezes, tinha sido preservado exclusivamente pela graça e misericórdia divinas. Ainda sabia que esse Deus prometera proteção, segurança, bênçãos sem medida, se o povo O servisse.
Outra coisa importante que Israel também sabia, era que, certa vez esse Deus ordenou a construção da Arca da Aliança, onde Ele sempre Se manifestaria com poder e glória.
Todas as vezes, numa batalha, em que a Arca foi levada, Israel saiu-se vitorioso porque a presença do Senhor estava ali com eles, na Arca.
A Arca da Aliança, de fato, era vista como um diferencial entre a vitória e a derrota numa batalha.
Todos esses fatores alinhados fizeram com que Israel supusesse que a vitória era garantida. Não havia opções nem outra possibilidade. Nada mais passava na cabeça deles. A vitória era deles e pronto!
Respondida a primeira pergunta, vamos à segunda, que é a reação dos filisteus com sua vitória.
Creio que esta vitória dos filisteus foi vista como surpresa. Para os dois lados, mas me refiro aos filisteus. Acho que eles não esperavam que pudessem vencer a guerra. Tomar a Arca como espólio significou subjugar o mais temível dos deuses. Agora o Todo-Poderoso não era visto mais como tal. O que aconteceu com Quem jamais havia perdido uma batalha? Tornou-Se fraco? Impotente? Ah, talvez Ele fosse como os outros! Quem possui a melhor tática de guerra vence. E nesse dia quem venceu foi DAGOM! Enfim, Dagom descobriu vulnerabilidade no Deus de Israel!
A resposta à 3ª questão reflete claramente o equívoco do povo de Israel. Ele – Israel – nesse período de apostasia, não sabia que Deus não pode ser manipulado por ninguém e nem é servo de ninguém. Aqui nós podemos dar duas respostas ao que aconteceu com o nome de Deus nesse caso: a resposta de antes da Arca ter sido levada e a resposta após a Arca ter sido tomada pelos filisteus.
A resposta de antes da Arca ter sido tomada pode ser dada como sendo que o nome de Deus fora envergonhado. Como eles não poderiam saber que as razões de sua derrota se davam pelo fato de estarem em pecado contra Deus? Os filhos do sacerdote são chamados, com propriedade, de “filhos de Belial”; por ser ainda considerada a época dos juízes, exatamente nesse período é-nos dito várias vezes que, por não haver rei ainda em Israel, cada qual fazia aquilo que achava direito, ou seja, Israel era um povo sem direção.
Até que se apegando à Arca como se fosse um amuleto, e contando com a vitória, o que não ocorreu, o nome de Deus passou a ser desdenhado. Eles simplesmente não conseguiram conceber o que havia acontecido. A conclusão desta primeira parte da pergunta é que não se deve usar o nome de Deus em vão, como uma simpatia, pois quem o fizer acabará, um dia, ficando decepcionado.
A outra resposta a essa pergunta é que Deus não precisa de ninguém pra mostrar quem Ele é. E de fato Ele é o Todo-Poderoso. Faz o que quer, conforme Lhe apraz, e tudo com sabedoria e não apenas por fazer.
Agora, com a Arca nas mãos dos filisteus, Deus não poderia permitir que eles usassem e abusassem do Seu nome fazendo chacotas e piadas. O trato a partir de então foi direto com Deus. E, meu caro, com Deus ninguém brinca, e dEle ninguém zomba. Veja os fatos: Dagom, por duas vezes, é encontrado caído e peste e hemorroidas se espalharam entre os filisteus como uma praga.
Agora imagine os filisteus dizendo: “Brincadeira! O que será que estava acontecendo? Não O tínhamos vencido? É, talvez Ele fosse Todo-Poderoso mesmo. Mas como vamos saber? Ah, sim! Tenho uma ideia. Vamos devolver a Arca e fazer uma prova se esses males que nos acometeram vem dEle ou se é circunstancial.”
Essa parte é tão gloriosa, que temos que nos emudecer diante do poder que há no nome do Senhor. Os filisteus fizeram uma carroça e colocaram vacas que tinham crias. Soltaram-nas e, em situações naturais, essas vacas correriam de volta às suas crias, mas não foi o que aconteceu. Elas, como se não tivessem crias andaram em direção a Bete-Semes, cidade israelita. Os filisteus concluíram que os males tinham vindo de Deus mesmo e que Ele é o Senhor Todo-Poderoso.
Que aplicações podemos tirar dessas três respostas? Vejamo-las:
Os rumos da igreja brasileira têm se mostrado duvidosos. Consigo identificar aqui muitas semelhanças com o povo de Israel nesse período: quando se fala o nome igreja, já se pensa logo em Deus. Há uma relação entre igreja e Deus pelo fato de Jesus ter sido o fundador da igreja. Supõe-se que fazer parte da igreja, automaticamente significa pertencer a Jesus Cristo, como Israel supunha que o fato de serem hebreus significava que eram pessoas que pertenciam a Deus; supõe-se também que isso significa que todas as benesses da vida estão reservadas para quem está na igreja, enquanto que quem esteja fora dela não conta com as bênçãos de Deus – claro levando em conta que “bênçãos de Deus” seja vida financeira abastada. Aqui já vemos que os exemplos dizem o contrário.
Chavões têm sido criados dia-a-dia e até com textos bíblicos como “Tudo posso naquele que me fortalece”, “Somos mais que vencedores” para ficar entre os mais comuns. Quantos aos adesivos dos carros já se vê “esta é uma prova da minha fidelidade com Deus”, “fruto do dízimo” e frases afins. Não que eu seja contra essas frases, mas só digo que elas não refletem a realidade espiritual bíblica.
Confesso que sinto até vergonha de ver essas coisas, pois elas são relacionadas diretamente com as bênçãos de Deus na vida de alguém. Mas o que dizer de inúmeras pessoas que desprezam a Deus, zombam dEle, escarnecem-nO e até se declaram ateias, e andam esbanjando poder, riqueza, fama e glória humanas? O que elas possuem pode ser considerado como bênçãos de Deus? E até que ponto? E por que os bens dos outros (da igreja) são considerados como bênçãos de Deus e os do mundo não? Qual é a diferença e quem estabeleceu esta diferença?
E tem mais, você já percebeu que uma boa parte destes “cristãos” quando alcançam uma vida financeira melhor, assumem características de pessoas não cristãs? São insubmissos e independentes às autoridades eclesiásticas; paulatinamente vão perdendo o interesse pelos valores espirituais, práticas de oração, jejuns, leitura diária da Bíblia e a própria ida aos cultos vão sendo substituídos pelo cinema, festas, clubes de lazer e encontros sociais?
Vamos agora a comportamentos específicos: alguns já bebem, outros fumam, outros se prostituem, mentiras e enganos já são uma constante na vida dessas pessoas, e não se preocupam em esconder essas coisas consideradas um mau testemunho diante dos incrédulos. Não que eu esteja falando de perfeição, pois todos estão sujeitos a todos os erros, porém quero dizer que a preocupação com as práticas cristãs milenares como a busca pela santificação, o empenho nas orações e os desejos por Deus têm diminuído exponencialmente.
A pergunta é, como queremos que Deus seja favorável a nós se não O desejamos mais? Tentamos comprá-lO dizendo que recebemos muitas bênçãos dEle, mas apenas pra ver se conseguimos mais.
Rev. Charles Dewey
Rev. Charles Dewey é pastor na
Igreja Missionária Volta de Cristo
em Santa Mônica, Belo Horizonte.
Agradeço a contribuição deste amado Pastor em trazer esta meditação para nosso blog. Esse texto de Samuel realmente é um desafio para nós, cristãos do século 21, o século mais antropocêntrico que já existiu a revermos nossos conceitos sobre Deus e Sua igreja.
ResponderExcluirObrigado, Rev. Charles Dewey. Estamos à disposição para publicar mais textos seus. São significativos e inspiradores para nós todos.
Abraços.
A igreja está refletindo o seu contexto pós-moderno. Intensificou-se os relacionamentos utilitaristas e superficiais. O que estamos notando? Uma igreja amoldada por este século.
ExcluirExcelente leitura do Rev. Charles Dewey trazendo para nós o valor do compromisso e fé na pessoa de Deus Pai.
Forte abraço!
Wellington Miguel
IMVC em Esmeraldas
Graça e Paz,
ResponderExcluirMuito bom, gostei da reflexão.
Abração!
Há um crescente nesse tipo de “evangeliquês”, aonde a benção vem primeiro que o Deus da benção. Não importa como e nem como o importante é eu ser abençoado. E é apavorante saber que isso ronda muitas igrejas serias tradicionalíssimas, e pentecostais, como diz Ap. Paulo, “Si pensa estar em pé cuide para que não caia” (1 Co:10.12). Ou seja, se isso ainda não chegou a nossas igrejas devemos nos cuidar. Ótimo texto, excelente exposição de sua idéia Rev. Charles Dewey.
ResponderExcluirParabéns Rev. Charles Dewey, Excelente a sua reflexão.
ResponderExcluirTriste isso, não é? Tanto para Israel como para a igreja de hoje, que vai perdendo o referencial de povo de Deus e se aderindo ao mundo como se isso fosse normal. A presença de Deus é tudo o que nós precisamos em qualquer circunstância, sem ela a vida fica vazia. Deus nos agracie com Sua linda, maravilhosa e doce presença sempre.
ResponderExcluirParabéns, Rev. Charles Dewey, por trazer à nossa memória algo tão necessário.